sábado, 29 de setembro de 2012

Laíssa Sobral, estudante e ex-catadora de lixo

Uma catadora de lixo criada em uma comunidade carente de São Paulo, passou por cima de todos os preconceitos em busca de um sonho. Com 19 anos de idade, Laíssa Sobral Martins conquistou uma vaga, dentre centenas de concorrentes, em uma das universidades públicas mais concorridas do Brasil.
O interesse em ajudar a cooperativa em que trabalhava como catadora motivou jovem a batalhar por uma vaga em um curso superior.
Laíssa trabalhou como catadora de lixo até 2011. O trabalho era pesado: separar rapidamente o lixo orgânico exige força física e eram poucos jovens que trabalhavam nessa função. Segundo a mãe dela, Maria Lúcia Sobral, atual presidente da cooperativa, a jovem sempre foi motivada e nunca reclamou da pesada da rotina de trabalhar e estudar.
Laíssa trabalhou como catadora de lixo até 2011, quando passou no vestibular para curso de gestão ambiental
Divulgação Laíssa trabalhou como catadora de lixo até 2011, quando passou no vestibular para curso de gestão ambiental 

“Não é difícil fazer a coleta seletiva, mas sim mudar o hábito de não reciclar. Buscamos conscientizar a todos sobre isso, mostrando a importância do trabalho dos catadores”, explica Laíssa.
Ela foi criada em um barraco de lona, na zona sul da capital paulista, onde morava com a família. Com pouco dinheiro, sobrevivia por meio de muito trabalho. A estudante utilizava cadernos e livros encontrados em lixeiras. Ela arrancava as folhas que estavam escritas e usava as que estavam em branco.
Enquanto isso, a mãe de Laíssa recolhia de feiras livres alimentos que ficavam no chão. “As pessoas diziam que era um pecado eu levar meus filhos para buscar comida comigo, mas erro mesmo era deixá-los lá na favela, a mercê do tráfico”, afirma Mara Lúcia.
Desde pequena, a universitária já ia atrás de seus objetivos. Com apenas oito anos quis saber quem era seu pai. “Não queria falar, pois sofri muito por ele não assumir a responsabilidade, mas disse a ela que morava no mesmo bairro que nós e se chamava Luiz”, contou a mãe.
Com essas informações, encontrou um homem com a mesma feição na rua de seu bairro e, sozinha, o abordou: estava frente a frente com o próprio pai. A partir daquele dia não se separaram mais, até a morte dele, em 2009.
Luta por causas importantes
Militante de causas sociais, Laíssa defende os catadores de resíduos recicláveis por meio do Movimento Nacional dos Catadores. Já teve um encontro com a presidenta Dilma Rousseff, em que, ela e a mãe, reivindicaram apoio para a coleta seletiva em São Paulo.
Também participa do Movimento da População em Situação de Rua, Movimento Negro Unificado, na Rede de Comunidades do Extremo Sul e na ONG Um teto para meu País (UTPMP). Essa última reúne jovens e universitários voluntários, de 18 a 30 anos, para a construção de casas de emergência, feita de madeira pré-fabricada, em comunidades carentes.

“Laíssa participou quatro vezes no mesmo ano como voluntária. É uma pessoa extrovertida e fácil de fazer amizades. Os outros universitários admiraram a história de vida dela”, lembra o diretor de formação e voluntariado da ONG UTPMP, Júlio Lima.
Vaga na universidade pública
Ainda como catadora, em 2011, ingressou em uma universidade particular, no curso de gestão ambiental. Havia dificuldades em arcar com os estudos, já que também ajudava com as despesas da família.
Nesse meio tempo, participou do curso de introdução à Economia Solidária e conquistou uma vaga para trabalhar em uma incubadora de empreendimentos solidários na ITCP- USP (Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Universidade de São Paulo).
O novo trabalho oferecia um salário menor ao da cooperativa. Então, resolveu prestar vestibular para as vagas remanescentes da USP, no mesmo curso que fazia. Mas a lista de livros para auxiliar na prova da universidade era grande e as condições para obtê-los não eram favoráveis.
Houve ajuda de todos os lados. Um blog divulgou sua dificuldade em conseguir os livros e, com isso, o material chegava até mesmo pelo correio. Outras pessoas próximas da estudante também a ajudaram nesse processo.
Depois de muito estudo, ela passou em 4º lugar. “Não procurei a USP por ser a melhor universidade, mas sim, porque ela tem que ser espaço de pobres. As pessoas que vivem em condições inferiores devem explorar as oportunidades e se preparem, sempre. Devemos lutar pelas oportunidades e não abaixar a cabeça para o capitalismo”, afirma Laíssa.

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