EJA precisa aumentar a oferta e atingir público
A necessidade de erradicar o analfabetismo no Brasil é consenso em todo discurso que atrela educação e desenvolvimento nacional, em qualquer esfera da sociedade. Está presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e no Projeto de Lei do novo Plano Nacional de Educação. Na prática, continua uma ferida aberta, principalmente quando se pensa pela ótica da gestão pública da educação.
Variadas fontes apontam os poucos progressos obtidos no Brasil nos últimos anos em termos de cobertura e atendimento à demanda por escolarização a adultos e jovens excluídos do mundo letrado. Em 2009 ainda existiam 14,1 milhões de analfabetos com 15 anos ou mais no país, o que correspondia a 9,7% da população nesta faixa etária, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Os dados mostraram que a taxa de analfabetismo caiu 1,8 ponto percentual entre 2004 e 2009.
A Pnad 2009 estimou a taxa de analfabetismo funcional (pessoas de 15 anos ou mais de idade com menos de quatro anos de estudos) em 20,3% da população. O índice é 4,1 pontos percentuais menor que o de 2004. As matrículas na Educação de Jovens e Adultos, em contrapartida, totalizaram 4 milhões naquele ano, considerando ensino fundamental e médio, de acordo com o Censo Escolar do MEC/Inep.
Os índices de cobertura da Educação de Jovens e Adultos são "irrisórios", de acordo com Maria Clara Di Pierro, pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo cujo doutorado versou sobre as políticas para a modalidade. "A matrícula em EJA nunca chegou a 10% da demanda potencial. Dados censitários apontam que a população sem ensino fundamental completo (oito anos de estudos) é da ordem de 65 milhões de brasileiros acima de 15 anos. A oferta está muito aquém das necessidades", analisa a especialista.
Em meio a essa profusão de indicadores, uma primeira depuração se faz necessária: o quanto desse contingente de analfabetos e pessoas com baixa escolaridade concorre, na prática, aos bancos escolares. É o que explica Maria Clara. "Nem toda demanda potencial se converte em demanda efetiva, porque depende das aspirações que as pessoas têm, das perspectivas de mudança de vida e da própria dinâmica em que estão inseridas", afirma.
Esse fator está relacionado aos diferentes perfis dos analfabetos, também indicados pelas pesquisas populacionais. Em 2009, a taxa de analfabetismo no Nordeste estava em 18,7% segundo a Pnad, quase o dobro da média nacional. "Existem diferenças de indicadores entre as zonas rural e urbana, entre afrodescendentes e brancos, por faixa etária. Então, a demanda potencial é a da população mais pobre, que vive na zona rural, predominantemente negra, além dos mais idosos", detalha Maria Clara. Segundo ela, a oferta de EJA, por outro lado, está fortemente concentrada nas áreas metropolitanas, na região Sudeste.
Além de o atendimento não chegar aonde é mais necessário, a situação desta modalidade de ensino no país se agrava com a queda no número de matrículas. Em 2009, foram registrados 2,8 milhões de alunos de EJA no ensino fundamental e 1,2 milhão no ensino médio. A taxa de matrícula vem diminuindo progressivamente em relação a 2006, quando havia 3,5 milhões de matrículas no ensino fundamental e 1,3 milhão no ensino médio. Os dados são do Censo Escolar MEC/Inep.
"Ultimamente nossa pergunta é: por que a matrícula em EJA está caindo? Será que a demanda não está se expressando? E por quais razões?", indaga a especialista da Feusp.
A resposta para a queda nas matrículas em EJA suscita um leque de hipóteses relacionadas de forma mais ampla aos desafios para sua plena implementação no Brasil. "Existe uma multiplicidade de respostas para a questão, baseadas em fatores que atuam em conjunto: o formato ainda muito convencional da escola, poucos esforços e falta de estímulos a estados e municípios para investir em EJA, além da escassez de políticas intersetoriais das áreas de saúde, transporte, assistência social", lista Roberto Catelli, que coordena o programa de EJA na Ação Educativa - organização voltada a promover os direitos educativos e da juventude.
Para a pesquisadora Francisca Izabel Pereira Maciel - do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (Ceale), órgão da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais -, a motivação para os alunos de EJA está relacionada à sua inserção em uma sociedade que tem forte demanda de uso da escrita e leitura. "Ler e escrever não é aprendizagem fácil. Muito mais do que uma técnica, envolve letramento, fazer uso social dessa tecnologia. Quem não utiliza não aprimora, pode acabar desaprendendo", explica.
Segundo Francisca, o desafio para coordenadores de projetos e professores de EJA está em propiciar a articulação do ensinar a ler e escrever com suas funções e usos na sociedade. A começar por uma diferenciação da alfabetização para jovens e adultos em relação à que é destinada e formatada para crianças.
"A mobilização para matrículas em EJA depende de uma aproximação dos gestores das redes de ensino com a população, para identificar dados - que se encontram muito desagregados em diferentes áreas da administração - reveladores de necessidades próprias por bairros e municípios", afirma Leila Loureiro, assessora técnico-pedagógica da Secretaria de Educação de Olinda (PE). A leitura destas informações encontrará pessoas em situações que escapam à esfera da pasta educacional. Aí entra a defesa, por parte dos especialistas, da adoção de políticas intersetoriais para implantação de EJA.
Trata-se de criar condições para o aluno simplesmente ter acesso à escola. "Em EJA, lidamos com baixa renda, desemprego, pessoas que têm filhos. Temos de pensar em como fazer para atendê-las, oferecendo, por exemplo, assistência em saúde, creche para os filhos", complementa Catelli, da Ação Educativa.
Outro ponto é evitar o abandono. "A permanência dos alunos em EJA, com sucesso, está relacionada à adequação do programa, o que se consegue com as políticas de intersetorialidade. Já acompanhei casos de alunos que têm dificuldade em assistir às aulas à noite porque não enxergam direito e não possuem óculos, ou que faltam e se sentem desestimulados por problemas de saúde como pressão alta", relata Leila.
Considerando as particularidades regionais do Brasil, Maria Clara Di Pierro sugere políticas intersetoriais que contemplem distribuição de renda, acesso à terra, geração de trabalho, qualificação profissional, além de saúde, alimentação e transporte, para propiciar o acesso e a frequência. "Se a iniciativa está no campo, tratar com assistência rural, saúde, meio ambiente. O ideal são medidas mais focalizadas, ajustadas aos contextos e conectadas com outras estratégias."
As políticas educacionais levadas à prática nos últimos anos apontam que a Educação de Jovens e Adultos tem recebido importância secundária frente a outras modalidades de ensino e grupos de idade, argumenta Maria Clara Di Pierro, em artigo que analisa a EJA no Plano Nacional de Educação 2001-2010, na publicação Educação & Sociedade.
Vontade política e o envolvimento dos entes municipais e estaduais são fundamentais para o avanço da modalidade, defende Roberto Catelli, da Ação Educativa. Na configuração do atual sistema educacional brasileiro, EJA continua buscando seu espaço.
Maria Clara Di Pierro identifica uma série de iniciativas nas políticas do governo federal nos últimos anos. "O Programa Brasil Alfabetizado, coordenado pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad / MEC); o Programa Nacional de Inclusão de Jovens - Projovem, gerido pela Secretaria Nacional de Juventude; o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja), mantido pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC; o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário; e o Exame Nacional de Certificação de Competências, realizado pelo Inep", lista.
Em sua avaliação, tais iniciativas encontram-se "precariamente articuladas entre si". Roberto Catelli, da Ação Educativa, questiona o curto alcance do Proeja, por exemplo, dado o potencial da proposta. Os resultados de tais programas são pouco mensurados ou divulgados. O Ministério da Educação não atendeu à solicitação da revista para fornecer informações sobre o tema.
Por parte das redes estaduais e municipais, um dos entraves ao desenvolvimento da educação de jovens e adultos pode estar relacionado ao financiamento. Quando o Fundeb entrou em vigor, em 2007, estabeleceu fator de ponderação 0,8 para esta modalidade de ensino. O fator de ponderação é um índice atrelado a um valor de referência, no caso a remuneração por aluno que o fundo dá à primeira etapa do ensino fundamental, que é 1. No caso de EJA, a remuneração é de 80% do valor por aluno pago no fundamental 1.
Se por um lado foi um avanço em comparação à situação anterior, em que o precedente Fundef sequer contemplava a EJA, por outro lado, as matrículas caíram. "Uma hipótese é a de que os gestores estariam configurando os alunos jovens e adultos como inscritos em educação regular, declarando-os como estudantes com defasagem idade-série, classes de aceleração ou algo do tipo", afirma Maria Clara. A manobra visaria receber o valor do Fundeb referente ao fator de ponderação mais alto.
Outra possibilidade, segundo ela, é a pressão social sobre a administração pública, voltada para a educação de crianças. "A cultura do direito à educação na infância e a necessidade de as mulheres trabalharem influenciam as decisões políticas", diz. Já a cultura da educação de adultos ainda está por se construir, a demanda social é tênue e desorganizada. Para esta população, a resposta do gestor acontece em forma de programas simples, seguindo o modelo tradicional da escolarização, que acaba gerando evasão e resultados insatisfatórios.
Em um cenário de grandes desafios e problemas estruturais, a educação de jovens e adultos no Brasil não deixa de apresentar avanços, seja na perspectiva macro, seja para aqueles que se apropriam da leitura e escrita para ganhar uma condição social menos opressiva em sua história de exclusão.
Maria Clara Di Pierro avalia que houve um incremento na colaboração da União com os estados e municípios, por meio da institucionalização da EJA no sistema de ensino básico (pelo Fundeb e pela Lei nº 11.497/2009, que regulamentou a inclusão no Programa Dinheiro Direto na Escola). Além disso, a modalidade passou a ser incluída nos programas de assistência aos estudantes que proveem alimentação, transporte escolar e livro didático. "Essas medidas, durante o governo Lula, colocaram a educação de adultos no terreno da disputa da Educação Básica, o que é importante".
Em um aspecto mais amplo, está a retórica da educação ao longo da vida, que lança as bases para a atual configuração da Educação de Jovens e Adultos, não como uma recuperação do passado perdido, mas como direito do sujeito ao exercício da cidadania.
(Revista Escola Pública)
Variadas fontes apontam os poucos progressos obtidos no Brasil nos últimos anos em termos de cobertura e atendimento à demanda por escolarização a adultos e jovens excluídos do mundo letrado. Em 2009 ainda existiam 14,1 milhões de analfabetos com 15 anos ou mais no país, o que correspondia a 9,7% da população nesta faixa etária, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Os dados mostraram que a taxa de analfabetismo caiu 1,8 ponto percentual entre 2004 e 2009.
A Pnad 2009 estimou a taxa de analfabetismo funcional (pessoas de 15 anos ou mais de idade com menos de quatro anos de estudos) em 20,3% da população. O índice é 4,1 pontos percentuais menor que o de 2004. As matrículas na Educação de Jovens e Adultos, em contrapartida, totalizaram 4 milhões naquele ano, considerando ensino fundamental e médio, de acordo com o Censo Escolar do MEC/Inep.
Os índices de cobertura da Educação de Jovens e Adultos são "irrisórios", de acordo com Maria Clara Di Pierro, pesquisadora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo cujo doutorado versou sobre as políticas para a modalidade. "A matrícula em EJA nunca chegou a 10% da demanda potencial. Dados censitários apontam que a população sem ensino fundamental completo (oito anos de estudos) é da ordem de 65 milhões de brasileiros acima de 15 anos. A oferta está muito aquém das necessidades", analisa a especialista.
Em meio a essa profusão de indicadores, uma primeira depuração se faz necessária: o quanto desse contingente de analfabetos e pessoas com baixa escolaridade concorre, na prática, aos bancos escolares. É o que explica Maria Clara. "Nem toda demanda potencial se converte em demanda efetiva, porque depende das aspirações que as pessoas têm, das perspectivas de mudança de vida e da própria dinâmica em que estão inseridas", afirma.
Esse fator está relacionado aos diferentes perfis dos analfabetos, também indicados pelas pesquisas populacionais. Em 2009, a taxa de analfabetismo no Nordeste estava em 18,7% segundo a Pnad, quase o dobro da média nacional. "Existem diferenças de indicadores entre as zonas rural e urbana, entre afrodescendentes e brancos, por faixa etária. Então, a demanda potencial é a da população mais pobre, que vive na zona rural, predominantemente negra, além dos mais idosos", detalha Maria Clara. Segundo ela, a oferta de EJA, por outro lado, está fortemente concentrada nas áreas metropolitanas, na região Sudeste.
Além de o atendimento não chegar aonde é mais necessário, a situação desta modalidade de ensino no país se agrava com a queda no número de matrículas. Em 2009, foram registrados 2,8 milhões de alunos de EJA no ensino fundamental e 1,2 milhão no ensino médio. A taxa de matrícula vem diminuindo progressivamente em relação a 2006, quando havia 3,5 milhões de matrículas no ensino fundamental e 1,3 milhão no ensino médio. Os dados são do Censo Escolar MEC/Inep.
"Ultimamente nossa pergunta é: por que a matrícula em EJA está caindo? Será que a demanda não está se expressando? E por quais razões?", indaga a especialista da Feusp.
A resposta para a queda nas matrículas em EJA suscita um leque de hipóteses relacionadas de forma mais ampla aos desafios para sua plena implementação no Brasil. "Existe uma multiplicidade de respostas para a questão, baseadas em fatores que atuam em conjunto: o formato ainda muito convencional da escola, poucos esforços e falta de estímulos a estados e municípios para investir em EJA, além da escassez de políticas intersetoriais das áreas de saúde, transporte, assistência social", lista Roberto Catelli, que coordena o programa de EJA na Ação Educativa - organização voltada a promover os direitos educativos e da juventude.
Para a pesquisadora Francisca Izabel Pereira Maciel - do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (Ceale), órgão da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais -, a motivação para os alunos de EJA está relacionada à sua inserção em uma sociedade que tem forte demanda de uso da escrita e leitura. "Ler e escrever não é aprendizagem fácil. Muito mais do que uma técnica, envolve letramento, fazer uso social dessa tecnologia. Quem não utiliza não aprimora, pode acabar desaprendendo", explica.
Segundo Francisca, o desafio para coordenadores de projetos e professores de EJA está em propiciar a articulação do ensinar a ler e escrever com suas funções e usos na sociedade. A começar por uma diferenciação da alfabetização para jovens e adultos em relação à que é destinada e formatada para crianças.
"A mobilização para matrículas em EJA depende de uma aproximação dos gestores das redes de ensino com a população, para identificar dados - que se encontram muito desagregados em diferentes áreas da administração - reveladores de necessidades próprias por bairros e municípios", afirma Leila Loureiro, assessora técnico-pedagógica da Secretaria de Educação de Olinda (PE). A leitura destas informações encontrará pessoas em situações que escapam à esfera da pasta educacional. Aí entra a defesa, por parte dos especialistas, da adoção de políticas intersetoriais para implantação de EJA.
Trata-se de criar condições para o aluno simplesmente ter acesso à escola. "Em EJA, lidamos com baixa renda, desemprego, pessoas que têm filhos. Temos de pensar em como fazer para atendê-las, oferecendo, por exemplo, assistência em saúde, creche para os filhos", complementa Catelli, da Ação Educativa.
Outro ponto é evitar o abandono. "A permanência dos alunos em EJA, com sucesso, está relacionada à adequação do programa, o que se consegue com as políticas de intersetorialidade. Já acompanhei casos de alunos que têm dificuldade em assistir às aulas à noite porque não enxergam direito e não possuem óculos, ou que faltam e se sentem desestimulados por problemas de saúde como pressão alta", relata Leila.
Considerando as particularidades regionais do Brasil, Maria Clara Di Pierro sugere políticas intersetoriais que contemplem distribuição de renda, acesso à terra, geração de trabalho, qualificação profissional, além de saúde, alimentação e transporte, para propiciar o acesso e a frequência. "Se a iniciativa está no campo, tratar com assistência rural, saúde, meio ambiente. O ideal são medidas mais focalizadas, ajustadas aos contextos e conectadas com outras estratégias."
As políticas educacionais levadas à prática nos últimos anos apontam que a Educação de Jovens e Adultos tem recebido importância secundária frente a outras modalidades de ensino e grupos de idade, argumenta Maria Clara Di Pierro, em artigo que analisa a EJA no Plano Nacional de Educação 2001-2010, na publicação Educação & Sociedade.
Vontade política e o envolvimento dos entes municipais e estaduais são fundamentais para o avanço da modalidade, defende Roberto Catelli, da Ação Educativa. Na configuração do atual sistema educacional brasileiro, EJA continua buscando seu espaço.
Maria Clara Di Pierro identifica uma série de iniciativas nas políticas do governo federal nos últimos anos. "O Programa Brasil Alfabetizado, coordenado pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad / MEC); o Programa Nacional de Inclusão de Jovens - Projovem, gerido pela Secretaria Nacional de Juventude; o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja), mantido pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC; o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário; e o Exame Nacional de Certificação de Competências, realizado pelo Inep", lista.
Em sua avaliação, tais iniciativas encontram-se "precariamente articuladas entre si". Roberto Catelli, da Ação Educativa, questiona o curto alcance do Proeja, por exemplo, dado o potencial da proposta. Os resultados de tais programas são pouco mensurados ou divulgados. O Ministério da Educação não atendeu à solicitação da revista para fornecer informações sobre o tema.
Por parte das redes estaduais e municipais, um dos entraves ao desenvolvimento da educação de jovens e adultos pode estar relacionado ao financiamento. Quando o Fundeb entrou em vigor, em 2007, estabeleceu fator de ponderação 0,8 para esta modalidade de ensino. O fator de ponderação é um índice atrelado a um valor de referência, no caso a remuneração por aluno que o fundo dá à primeira etapa do ensino fundamental, que é 1. No caso de EJA, a remuneração é de 80% do valor por aluno pago no fundamental 1.
Se por um lado foi um avanço em comparação à situação anterior, em que o precedente Fundef sequer contemplava a EJA, por outro lado, as matrículas caíram. "Uma hipótese é a de que os gestores estariam configurando os alunos jovens e adultos como inscritos em educação regular, declarando-os como estudantes com defasagem idade-série, classes de aceleração ou algo do tipo", afirma Maria Clara. A manobra visaria receber o valor do Fundeb referente ao fator de ponderação mais alto.
Outra possibilidade, segundo ela, é a pressão social sobre a administração pública, voltada para a educação de crianças. "A cultura do direito à educação na infância e a necessidade de as mulheres trabalharem influenciam as decisões políticas", diz. Já a cultura da educação de adultos ainda está por se construir, a demanda social é tênue e desorganizada. Para esta população, a resposta do gestor acontece em forma de programas simples, seguindo o modelo tradicional da escolarização, que acaba gerando evasão e resultados insatisfatórios.
Em um cenário de grandes desafios e problemas estruturais, a educação de jovens e adultos no Brasil não deixa de apresentar avanços, seja na perspectiva macro, seja para aqueles que se apropriam da leitura e escrita para ganhar uma condição social menos opressiva em sua história de exclusão.
Maria Clara Di Pierro avalia que houve um incremento na colaboração da União com os estados e municípios, por meio da institucionalização da EJA no sistema de ensino básico (pelo Fundeb e pela Lei nº 11.497/2009, que regulamentou a inclusão no Programa Dinheiro Direto na Escola). Além disso, a modalidade passou a ser incluída nos programas de assistência aos estudantes que proveem alimentação, transporte escolar e livro didático. "Essas medidas, durante o governo Lula, colocaram a educação de adultos no terreno da disputa da Educação Básica, o que é importante".
Em um aspecto mais amplo, está a retórica da educação ao longo da vida, que lança as bases para a atual configuração da Educação de Jovens e Adultos, não como uma recuperação do passado perdido, mas como direito do sujeito ao exercício da cidadania.
(Revista Escola Pública)
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