Brasília - Seis meses depois de a Agência Brasil noticiar que juízes de todo o país autorizaram mais de 33 mil crianças a trabalhar
antes de completar os 16 anos, auditores fiscais do Trabalho afirmam
que boa parte dessas autorizações judiciais pode não existir. Os dados
sobre o número de alvarás foram fornecidos pelas próprias empresas que,
anualmente, precisam declarar informações ao governo por meio da Relação
Anual de Informações Sociais (Rais). Apesar da falta das autorizações,
foi constatada a presença de crianças e adolescentes trabalhando.
Surpreendidas pelo grande número de alvarás informados pelas empresas de Mato Grosso do Sul e de São Paulo,
as superintendências do Ministério do Trabalho nos dois estados
decidiram verificar cada um dos registros da Rais. Segundo as
coordenadoras de combate ao trabalho infantil das duas
superintendências, os auditores encontraram vários problemas nos dados
repassados pelas empresas ao governo federal. Desde informações erradas –
como a data de nascimento de empregados que, na verdade, já tinham mais
de 18 anos à época –, até falsas notificações envolvendo a contratação
de menores de 16 anos sem autorização judicial. As empresas flagradas
nessa situação serão autuadas.
"Tenho 28 anos de fiscalização do trabalho e nunca pensei que tivesse
tanto erro assim na Rais. É um absurdo", declarou a coordenadora do
projeto de combate ao trabalho infantil da Superintendência do
Ministério do Trabalho em Mato Grosso do Sul, Regina Rupp Catarino.
A Rais – fonte dos números que o Ministério do Trabalho e Emprego e o Ministério Público do Trabalho forneceram à Agência Brasil
em outubro de 2011 – permite ao governo federal elaborar estatísticas,
além de controlar e fornecer informações sobre o mercado de trabalho
brasileiro. Segundo o próprio Ministério do Trabalho, os dados coletados
servem também à elaboração de políticas públicas e de leis
trabalhistas, além dos controles dos registros do FGTS, dos sistemas de
arrecadação, concessão de benefícios previdenciários e à identificação
do trabalhador com direito ao abono salarial PIS/Pasep.
Prestes a concluir a conferência das 350 autorizações judiciais
informadas pelas empresas sul-matogrossenses na Rais de 2010, a
superintendência identificou apenas cinco alvarás expedidos por juízes a
menores de 16 anos. “Procuramos identificar os jovens portadores das
autorizações e as empresas onde eles estavam ou estiveram empregados.
Solicitamos que as empresas apresentassem os alvarás e, para a nossa
surpresa, começamos a ver que se tratavam mais de erros de informação no
preenchimento da declaração. Ou então que as empresas simplesmente não
tinham a autorização”, disse Regina à Agência Brasil, criticando a falta de preocupação das empresas com a veracidade dos dados fornecidos.
“Para conseguir transmitir o formulário, os contadores das empresas
mentiram, respondendo que tinham autorizações judiciais. Em vez de
checar o porquê da pergunta, o responsável por preencher a Rais
simplesmente respondeu que sim e enviou a declaração. Há vários casos
assim, de falta de atenção”, declarou Regina, mencionando o exemplo de
uma rede nacional de fast food que teve de corrigir as
informações de seus funcionários em todo o país depois que os auditores
de Mato Grosso do Sul identificaram erros no preenchimento da Rais.
Entre os casos inicialmente informados no estado, Regina diz que
aproximadamente 50% (175 registros) envolvem adolescentes menores de 16
anos contratados para trabalhar sem autorização judicial. Cerca de 30%
envolvem o fornecimento de informações erradas a respeito de
funcionários que já tinham idade para ingressar no mercado de trabalho
regularmente. Na primeira situação, as empresas foram duplamente
autuadas: por contratar menores de idade sem a autorização judicial e
também por falsa notificação. Nos demais casos, a superintendência
exigiu que os formulários fossem corrigidos. A partir de agosto deste
ano, os auditores voltarão a inspecionar todas as empresas.
O coordenador nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e
Adolescentes do Ministério Público do Trabalho, o procurador Rafael
Dias Marques, disse que, se confirmadas as inconsistências, os
responsáveis pelas empresas autuadas podem responder administrativa,
civil e penalmente. “Vai ser necessário apurar a responsabilidade dos
que forneceram as informações e checar se há algo que configure eventual
prática delituosa. Se foi apenas um erro ou se houve má-fé”, disse.
Edição: Lílian Beraldo
FONTE: AGÊNCIA BRASIL.
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